O Supremo Tribunal Federal (STF) tomou nesta quinta-feira 26 mais uma
decisão histórica, ao decidir, por unanimidade, que as cotas raciais
estabelecidas por universidades públicas são constitucionais. O julgamento se
dá após anos de debates sobre o tema e deve colocar fim à insegurança jurídica
a respeito da reserva de vagas para determinados grupos.
O Supremo tomou a decisão ao julgar
duas ações diferentes. A primeira era uma Arguição de Descumprimento de
Preceito Fundamental (ADPF 186), de autoria do Democratas (DEM), contra a
Universidade de Brasília (UnB), que reserva 20% das vagas do vestibular para
estudantes negros. O argumento do partido, defendido principalmente pelo
senador Demóstenes Torres, hoje mergulhado em um escândalo de corrupção, era de
que as cotas raciais ferem o princípio da igualdade. A outra ação é um Recurso
Extraordinário (RE 597285) de um estudante gaúcho que foi eliminado do
vestibular da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) embora tivesse
obtido notas superiores às dos cotistas. Isso ocorreu porque a universidade
reserva 30% das vagas para quem estudou na rede pública, sendo que metade dessa
cota é destinada aos candidatos que se declararem negros na inscrição.
O ministro Ricardo Lewandowski era o
relator dos dois processos e, ainda na quarta-feira 25, proferiu seu voto
favorável à constitucionalidade das cotas raciais. Lewandowski afirmou que os
programas de ação afirmativa têm como finalidade acabar com o sentimento de
discriminação por pertencer à determinada raça. “Não basta não discriminar. É
preciso viabilizar. A postura deve ser, acima de tudo, afirmativa. É necessária
que esta seja a posição adotada pelos nossos legisladores. A neutralidade
estatal mostrou-se, nesses anos, um grande fracasso”, disse.
Nesta quinta-feira, os ministros Luiz
Fux, Rosa Maria Weber, Cármen Lúcia, Joaquim Barbosa, Cezar Peluso, Gilmar
Mendes, Marco Aurélio Mello, Celso de Mello e o presidente da corte, Carlos
Ayres Britto, acompanharam o voto de Lewandowski. O ministro Dias Toffoli se
declarou impedido de participar do julgamento porque, na condição de
advogado-geral da União, teve de se pronunciar sobre o tema.
Para Fux, a raça pode e deve ser
critério político de análise para ingresso na universidade, como ocorre em
diversos países democráticos. “A construção de uma sociedade justa e solidária
impõe a toda coletividade a reparação de danos pretéritos perpetrados por
nossos antepassados”, disse.
A ministra Rosa Weber acredita que o
sistema de cotas visa a garantir aos negros mais oportunidades de acesso à
universidade e, assim, equilibrar as oportunidades sociais. “Se os negros não
chegam à universidade, não compartilham a igualdade de condições com os
brancos”. Para ela, quando o negro se tornar visível na sociedade, “política
compensatória alguma será necessária”.
De acordo com a ministra Cármen Lúcia,
as políticas compensatórias garantem a possibilidade de que todos se sintam
iguais. “As ações afirmativas não são as melhores opções. A melhor opção é ter
uma sociedade na qual todo mundo seja livre par ser o que quiser. Isso é uma
etapa, um processo, uma necessidade em uma sociedade onde isso não aconteceu
naturalmente”.
Joaquim Barbosa afirmou que ações
afirmativas são políticas públicas voltadas à concretização da neutralização
dos efeitos perversos da discriminação racial, de gênero, de idade e de origem.
“É natural que as ações afirmativas sofram um influxo de forças contrapostas e
atraiam resistência da parte daqueles que historicamente se beneficiam da
discriminação de que são vítimas os grupos minoritários”, disse o ministro.
Cezar Peluso, cujo voto, o sexto,
garantiu a legalidade do sistema de cotas nas universidades públicas, seguiu os
colegas, mas fez um alerta a respeito de defeitos que o sistema tem. “Não posso
deixar de concordar com o relator que a ideia [cota racial] é adequada,
necessária, tem peso suficiente para justificar as restrições que traz a certos
direitos de outras etnias. Mas é um experimento que o Estado brasileiro está
fazendo e que pode ser controlado e aperfeiçoado”, disse Peluso.
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