Para
realizar uma analise reflexiva a respeito da educação do campo, faz-se
necessário uma caracterização histórica desse segmento para não incorrermos no
risco de se naturalizar a negação desse direito subjetivo, uma vez, que estudos
têm mostrado que esse é um processo excludente de caráter social, fruto de um
sistema perverso baseado na logica capitalista e neoliberal.
O
campo ao longo do processo de democratização e redemocratização do país sempre
foi visto pelas instituições governamentais, como uma extensão periférica do
espaço urbano, isso contribuiu para a elaboração de políticas educacionais com
pouca consistência e excludentes em sua maioria, tendo como base paradigmas
urbano-rural. Essa concepção preconceituosa foi significativa na consolidação
de um processo histórico brutal de negação do acesso aos direitos
constitucionais dessa parcela da população, como uma cidadania plena, acesso a
bens econômicos, direitos trabalhistas e, em especial, o acesso a uma educação
contextualizada que não fosse fruto do ajustamento e adaptação pura e simples,
de políticas padronizadas para uma realidade especifica.
Conforme
NASCIMENTO (2008) o rompimento dessa visão unilateral construída ao longo dos
anos só foi possível graças às lutas de alguns movimentos sociais que apoiados
em sua cultura resistiram a imposições e assumiram uma dimensão proativa,
deixando a passividade de lado e tornando sujeito de sua própria historia.
Nesse contexto, os movimentos sociais ganharam definitivamente espaço
participativo na agenda de políticas implantadas por órgãos oficiais. Quando se
observa essas conquistas, fica evidente a importância dos movimentos de base
para as transformações recentes ocorridas no país em todos os aspectos, em
especial, para o processo de democratização do acesso, permanência e sucesso do
aluno na educação do campo. Temos exemplo de iniciativas como a Comissão
Pastoral da Terra (CPT), o Centro Popular de Cultura (CPC), Confederação
Nacional dos Trabalhadores na agricultura (Contag), Movimentos dos Sem Terras
(MST), além de movimentos religiosos, em especial a ala da Igreja Católica
denominada de teoria da Libertação, que conseguiram mobilizar setores
específicos, da cidade e do campo, formando uma unidade maior na luta por
conquistas coletivas.
Uma
análise histórica mostra que as escolas do campo sempre foram pensadas e
planejadas como um espaço isolado do processo de produção cultural, social e
econômico, sendo concebido apenas como uma instituição em que o professor
ministra sua aula pura e simples, com a finalidade de ofertar um conteúdo
programático mínimo, para instrumentalizar o filho do camponês e prepará-lo
para uma vida na cidade. Nessa linha de entendimento o campo e suas escolas
sempre foram visto como um espaço pejorativo e secundário com caráter provisório
e transitório rumo ao desenvolvimento “urbanocentrico”, termo utilizado para
definir a visão didático-pedagógica que utiliza o processo de ajustamento e
adaptação na transferência de currículos, calendários e conhecimentos
universais para realidades especificas do campo.
Essa
visão equivocada do campo tem colaborado para a construção de paradigmas
preconceituosos que causaram e causam danos quase irreversíveis, na formação
cultural e social das pessoas que vivem nas diversas comunidades que compões
esse contexto tão complexo. São atitudes, procedimentos e falas que foram
inculcadas no subconsciente dos alunos e professores do campo e que passam
despercebidas, mas que tem um impacto devastador nas ações daqueles que
deveriam ser protagonista na consolidação de seus direitos subjetivos.
Para
inverter essa lógica é preciso redimensionar o conceito de campo e da educação
ofertada para aqueles que nele vivem, indo além do conceito de meio rural
apenas com espaço de produções agrícolas, e sim um espaço, que tem sua própria
lógica na produção de suas condições de existências. Pois segundo o parecer
36/2001 SECAD/MEC (2007:13), o campo hoje, ”tem um significado que incorpora os
espaços da floresta, da pecuária, das minas e da agricultura, mas o ultrapassa
ao acolher em si os espaços pesqueiros, caiçaras, ribeirinhos e extrativistas.
O campo, nesse sentido, mais do que um perímetro não urbano, é um campo de
possibilidades que dinamizam a ligação dos seres humanos com a própria produção
das condições da existência social e com as realizações da sociedade humana”.
Concebendo
o meio rural como espaço dinâmico que perpassa a visão unilateral dos setores
conservadores, as escolas que ofertam a educação do campo, no campo e para o
campo não podem ser consideradas como um simples local de dar aula, aonde
prepara aqueles que vivem em bolsões a margem dos centros urbanos para viverem
nas cidades. Deve-se ao contrario, ser compreendida como aquela que esta
inserida no espaço geográfico identificadas com o campo, mesmo que suas sedes
estejam em área consideradas urbanas, mas que atende a população que tem sua
produção, econômica, social e cultural, predominantemente vinculada às
comunidades que integram essa realidade. Pois segundo (Menezes Neto, Chaves
2003:25, 2008), esta educação não pode ser dirigida para a reprodução de
capital, mas deve ser uma educação sobre a qual os trabalhadores e seus filhos
possam construir novas relações sociais, um novo modelo de sociedade, calcado
no trabalho, na justiça social, na distribuição de renda, na reforma agrária.
Pois como disse (Karl Max) as circunstâncias fazem o ser humano, na mesma
medida em que este faz as circunstancias.
Por
fim, considerando a realidade da educação no país e, em especial o abandono
histórico das comunidades rurais, o novo PNE precisa repensar a alocação de
recurso tento no que se refere ao montante, quanto na forma de gestão e a
qualidade na aplicação final desses recursos. Não se pode deixar de observar
que já em 2001 os movimentos sociais ligados a vários setores defendiam um
valor de 7% do PIB para o PNE da década passada e que foi vetado pelo presidente
Fernando Henrique Cardoso. A definição de valores no PNE 2011 não significa
necessariamente um avanço, pois, o valor é considerado insuficiente para
especialista, inclusive para o Presidente da Câmara Básica de Educação, que vai
propor o índice de 10% do Produto Interno Bruto. O plano tem que pensar em
instrumentos que garanta uma gestão mais democrática, que não centralize as
decisões na figura do gestor municipal e do responsável pelas finanças, mas que
possibilite mais autonomia ao gestor da pasta de educação e aos Conselhos
Municipais de Educação, do FUDEB e do PNAE. Pois em muitas situações os 25%
destinados à educação são utilizados para custear diversos tipos de despesas